Inovar deixou de ser simplesmente desenhar um produto eficiente. É necessário gerar conexão com os sentimentos dos consumidores.
Os inovadores sempre foram profissionais programados para enfrentar dificuldades, solucionar desafios e conceber produtos. Mais recentemente, combinar e aplicar tecnologias. E, assim, construir – na acepção da palavra – mais qualidade de vida e um mundo melhor. Mas tudo mudou de repente, e o modo de fazer e o foco principal da inovação não foram poupados. Boa parte das mais significativas inovações sequer envolve, propriamente, produtos. No novo lugar de destaque está a experiência vivida pelo consumidor, a UX (User Experience).
Desde uma ponte gigantesca unindo duas margens de um rio até um dispositivo para facilitar a preparação de alimentos na cozinha, todas essas realizações, até pouco tempo atrás, passavam pela mesma lógica “engenheirística”: problema, desenvolvimento de solução, cálculos e dimensionamento, especificação, protótipo de solução, testes, e, finalmente, melhoria da vida das pessoas.
Nós engenheiros, em especial, aprendemos nas escolas a enfrentar e resolver problemas complexos. Nos ensinaram também que as barreiras são superadas com a criação e o desenvolvimento de produtos. Minha história profissional é um bom exemplo. Ao longo de diversos anos de minha carreira eu sabia tudo sobre um assunto absolutamente específico: pneus. Projetávamos e construíamos o “melhor pneu possível”, com toda a engenharia (cálculos, materiais, processos de produção) à disposição à época, e colocávamos no mercado. E vendia, vendia muito!
A realidade dos negócios era outra. Se por acaso um consumidor não achasse o pneu bom, isso era considerado um problema pontual; muitas vezes, a culpa era atribuída ao próprio cliente, que não utilizou bem o produto ou não entendia nada de pneus – miopia nossa, mais grave ainda.
Uma história assim pode até parecer mentira aos olhos das gerações X, Y e Z. Para elas, e no mundo de hoje, inovar tem a ver com o poder e a autonomia do consumidor, com tecnologia da informação e aplicativos e, sobretudo, com as emoções. Isso mesmo. Descortina-se um espaço gigante para inovar: os laços emocionais que conectam pessoas e soluções, sejam elas produtos, aplicativos ou mesmo a “fria” ponte que citamos anteriormente.
Quer um exemplo? Participamos recentemente do projeto de um prédio de apartamentos no qual as garagens, em vez de espaços escuros e sem qualquer acabamento, foram planejadas para ser um lugar agradável, ajardinado, pintado e iluminado. Com muito pouco conseguiu-se acender a chama da paixão nos compradores. O conceito do produto se expandiu.
Inicialmente isso se deu pela dimensão “serviços associados” – a chamada servitização ou serviceirização. Mas a coisa não parou por aí, e os produtos ocuparam o campo fértil das emoções que são capazes de gerar, e que estão presentes em qualquer relação de compra. Podemos dizer que ganharam alma.
Mas como um produto inovador pode causar algum tipo de emoção, ou melhor, paixão?
Bem, as pessoas não compram apenas para suprir necessidades. Ao menos não quando há milhares de ofertas e opções o tempo todo, e para todo o tipo de produto. Elas compram o significado das coisas e buscam conexão direta entre este significado e o seu propósito de vida. O trabalho dos inovadores e projetistas ficou bem mais complexo. Em lugar dos exercícios de dimensionamento, de estabelecer formas e características de uso – algo racional e quantificável –, entra a empatia, que pode ser definida como a capacidade de sentir no lugar do outro. Em especial no mundo automotivo, onde o campo emocional é vastíssimo.
Não se trata mais de projetar um veículo de alta qualidade e beleza, mas de encontrar significados capazes de falar diretamente ao coração dos compradores ou locatários. Para isso será preciso desvendar o que passa na mente de cada tipo de consumidor, a cada momento e em cada realidade específica dos mercados. Em outras palavras, o que está processando a fabulosa máquina de sentir e interpretar do consumidor: seu cérebro.
Os inovadores ganham, assim, um papel cada vez mais nobre. De caçadores e projetistas de emoções. Parafraseando meu amigo Laurentino Bifaretti: “São as emoções, afinal, o elemento-chave capaz de, nas pessoas, transformar o simples existir em viver de verdade”.
Fonte: Automotive Business/Valter Pieracciani