Os computadores quânticos utilizam qubits ao invés dos bits dos computadores clássicos e, graças às suas propriedades quânticas, poderão resolver problemas complexos.
Quando perguntada em uma entrevista sobre como imaginava as bolsas de valores 20 anos no futuro, a CEO e presidente da Nasdaq, Adena Friedman, apontou tecnologias emergentes como Inteligência Artificial, Blockchain e Computação Quântica como elementos transformadores que, combinados, levariam as operações do mercado de ações a um novo patamar, com baixa fricção, operações simplificadas e aumento de inteligência na tomada de decisão graças ao uso de dados e à capacidade computacional ampliada das plataformas de negócios.
“Em 20 anos, com o potencial da computação quântica, você terá a capacidade de olhar milhares de resultados em segundos para entender qual o caminho certo e o preço certo para decidir comprar ou vender uma determinada empresa ou classe de ativos”, respondeu ao jornalista Caleb Silver, editor-chefe da Investopedia e apresentador do podcast The Investopedia Express.
Adena estava se referindo à uma nova classe de computadores cuja arquitetura, diferente dos computadores clássicos, não utiliza chips com milhões de transístores para armazenar e processar dados, representados como sequências de 0s e 1s (os bits). Nos computadores quânticos, os bits são substituídos por unidades básicas chamadas qubits (quantum bits), que são partículas subatômicas, como elétrons e prótons. Aí entram em ação a física e a mecânica quântica, e o processo deixa de ser binário (0 ou 1) para ser quântico: os qubits podem ser as duas coisas ao mesmo tempo, portanto permitem processar números complexos e muito mais dados simultaneamente.
É como jogar cara ou coroa. Enquanto a moeda está girando no ar, a resposta pode ser ao mesmo tempo cara e coroa e só vamos saber se é um ou outro quando ela cair. Durante o cálculo com milhões de informações, o computador quântico manipula os qubits de uma forma que essas probabilidades são superpostas (moeda girando), até que uma resposta seja necessária (moeda no chão, cara ou coroa).
A superposição é um dos truques de um computador quântico para executar operações com números complexos. O outro truque é o entrelaçamento (entanglement) de qubits. No computador quântico, quanto mais qubits, mais complexo e acelerado pode ficar o processamento, porque eles podem ser entrelaçados, amplificando seu poder.
Se em um computador clássico a capacidade de processamento aumenta linearmente (dois bits, o dobro do processamento), em um computador quântico o aumento dos qubits significa aumento exponencial da capacidade de processamento. Quanto mais qubits entrelaçados, mais combinações de informações podem ser calculadas ao mesmo tempo. Dois qubits, por exemplo, podem realizar quatro operações simultâneas. E essa capacidade vai crescendo a progressões geométricas.
Essas duas características dos computadores quânticos os tornam perfeitos para resolver, por exemplo, problemas de otimização, nos quais a melhor resposta só aparece depois de fazer milhares de combinações possíveis. E fazem isso a velocidades exponencialmente maiores que os computadores convencionais e com um consumo menor de energia.
Atualmente há dois tipos de computadores quânticos no mercado. Há o chamado “computador quântico universal”, que utiliza qubits e portas lógicas quânticas para realizar uma ampla gama de cálculos. E há um outro tipo de computador quântico, chamado “annealer quântico” (quantum annealer), cuja arquitetura trabalha com qubits mas não utiliza portas lógicas quânticas. A fabricante D-Wave é a mais conhecida empresa nesse cenário e oferece computadores quânticos projetados para negócios na nuvem. Esses computadores possuem mais qubits que os computadores quânticos universais atualmente disponíveis – os da D-Wave possuem 5.000 qubits –, mas seu processamento é mais limitado, sendo ideais para resolver problemas complexos de otimização, como encontrar a rota de entrega mais curta ou descobrir a melhor alocação de recursos.
A rede canadense de supermercados Save-On-Foods é usuária dos computadores quânticos da D-Wave para melhorar a logística das suas lojas desde 2020, executando um problema de otimização que não conseguia ser executado por computadores clássicos. Com o uso da tecnologia, desenvolveram um algoritmo quântico que reduz o tempo de processamento da aplicação de 25 horas por semana para meros segundos.
Bons para uso financeiro
Por conta da capacidade de otimização, os computadores quânticos são vistos como extremamente úteis no mercado financeiro, já que vários problemas de finanças caem nessa categoria, como por exemplo otimização de portfólio financeiro, explica Joseph Byrum, cientista de dados chefe do Principal Financial Group. “A avaliação de risco de um grande portfólio, que precisa ser feita durante a noite toda, ou que levaria dias em computadores clássicos, poderia ser feita em tempo real por um computador quântico”, escreve Byrum.
A computação quântica tem várias outras aplicações, incluindo engenharia de materiais, análise de interação de compostos químicos para gerar novos medicamentos, design de polímeros, design aeroespacial, manufatura, Inteligência Artificial, cibersegurança e criptografia, combate ao câncer e desenvolvimento de novos medicamentos. Na área militar e de segurança, podem ser usados para melhorar os radares e sua capacidade de detectar coisas como mísseis e aeronaves.
Para fazer cálculos complexos é necessário um computador quântico com muitos qubits, muitos mais do que até agora foi possível fazer em escala industrial e fora de ambientes controlados – a maioria dos computadores disponíveis trabalha com menos de 100 qubits. Construir um computador quântico universal é complexo e custa muito caro. Os qubits entrelaçados precisam estar em um ambiente estável, protegido de radiação, luz, som, vibrações e campos magnéticos. Os computadores quânticos trabalham no vácuo e necessitam de temperaturas próximas do zero absoluto para manter os qubits no estado quântico e evitar erros gerados pela chamada “decoerência” (decoherence) que é a degradação da superposição dos qubits, que gera erros de cálculo.
Em uma entrevista para a revista Nature, a pesquisadora Sara Metwalli, da Universidade Keio, em Tóquio, diz que “o estágio dos computadores quânticos atuais é comparável com a computação clássica no final dos anos 80”.
A dificuldade não impede que grandes empresas, governos e startups invistam na corrida pela fabricação desses computadores e por atingir a chamada supremacia quântica – provar que um computador quântico consegue resolver um problema que um computador clássico não conseguiria resolver em um tempo razoável. A lista de grandes empresas envolvidas na corrida quântica inclui Microsoft, IBM, Google, AWS, Honeywell, D-Wave, Intel, IonQ, NEC, Alibaba, PsiQuantum, Rigetti Computing, Silicon Quantum Computing, Xanadu, Raytheon, Lockheed Martin e Toshiba, entre outras.
Fonte: Inovabra